Filme – Parasita

Por Ana Lucia Gondim Bastos

O vencedor da Palma de Ouro de Cannes (2019), o coreano “Parasita” (Joon-ho-Bong), entra para a série de filmes recentes que nos apresenta, com verdadeiros socos no estômago, os cenários distópicos que estamos construindo com o acirramento das desigualdades sociais e o completo abandono de uma grande parte da população mundial, num “salve-se quem puder, e como puder, pois o poder público está voltado em garantir o bem estar e a segurança das grandes fortunas”. Joon-ho-Bong é muito habilidoso ao escrever um roteiro que trabalha, justamente, com núcleos familiares em posições sociais opostas: os que vivem num nível de precariedade extrema e os que usufruem toda a possibilidade de bem estar e conforto que as novas tecnologias e as políticas de privilégios podem oferecer. Extremos que, obviamente, por motivos diferentes, vivem um vale tudo como se não houvesse o amanhã, o outro, ou o lá fora, a não ser na medida da garantia da sobrevivência ou da manutenção do conforto. Uma sociedade que funciona numa ecologia parasitária, na qual a protocooperação está completamente fora das possibilidades desse meio social que construimos no sistema econômico no qual tudo vira mercadoria e pode ser monetarizado. A narrativa se dá a partir do momento no qual família  Ki-taek, que até então estava toda desempregada e sem perspectiva, aos poucos, vai sendo assimilada ao staff de cuidados com a vida e propriedades dos ricaços Parks, num vale tudo que, inicialmente, comporta pequenas trapaças, mas, que, progressivamente, vai ganhando assustadora vultuosidade. Chama a atenção a falta de solidariedade e empatia entre personagens fora do âmbito estritamente familiar, ainda quando estamos falando de pessoas da mesma classe social. Todos estão muito preocupados com sua própria sobrevivência: seja quando os ricos despedem seus empregados dos quais desconfiam das ações e dos hábitos ou dos empregados entre si, para garantirem seus empregos. É aí que perdemos o fio de Ariadne, aquele que poderia nos oferecer um rumo de esperança de saída do labirinto que nos enfiamos. Esse labirinto de desigualdades e disparidades que faz de uma chuva, deleite de uns, e destruição do pouco acumulado por outros. Que faz com que, muitas vezes, não se perceba como limites de tolerância, individuais e coletivos, estejam sendo testados e forçados, podendo levar tudo aos ares. Pessoas vivendo sentada em barris de pólvora e, como diz Lenine, “a loucura fingindo que tudo isso é normal”. Mais um filme nos mostrando que está passando da hora de reconhecermos que não deu certo e que as coisas, definitivamente, não permanecerão como estão.

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