Filme – Sobre Birdman e outros super heróis

Por Ana Lucia Gondim Bastos

Cercados pelo universo da publicidade, com seus sem-número de promessas de felicidade, de sucesso e de receitas para alcançar a perfeição e a plenitude, há gerações, assistimos meninos e meninas tornarem-se adultos crédulos em capas mágicas e em finais triunfantes. Chegam a acreditar que se não se sentem plenos, é porque não fizeram a coisa certa, ou seja, não acertaram na escolha do caminho que, com certeza, os levaria ao reino da fruição e do contentamento. Logo, a frustração sem tamanho os assombra com tanta força quanto a utilizada para se manterem agarrados à ilusão da completude narcísica. E assim vão vivendo numa montanha russa que ora os faz acreditar na supremacia de seus super poderes, ora os leva em queda livre ao vazio existencial. É o que acontece com Riggan Thomson, protagonista de  Birdman, filme de Alejandro Gozález (2015). Um ator (interpretado por Michael Keaton – nosso “para sempre” Batman, diga-se de passagem) que teve seu tempo áureo de fama e sucesso interpretando o Homem Pássaro, um super herói dos quadrinhos. No entanto, desde que se recusou a interpretar o personagem em seu quarto filme, Riggan deixou de ser o alvo dos holofotes da fama do cinema americano, grande ditame de critérios de sucesso. Prestes a estrear um novo trabalho no qual além de atuar, também assinará a direção, Riggan precisará lidar com tudo o que reside por trás das cortinas. Nesse momento de grande pressão e expectativa, o Homem Pássaro aparece como um alter ego que o convoca a entrar na referida montanha russa que leva, com rapidez e sem escalas, da onipotência à submissão. A interação dele com os outros personagens da trama – por exemplo, com a filha recém egressa de uma clínica de desintoxicação (interpretada por Emma Stone) ou com Mike, ator que entra para dividir o palco e o brilho da peça (interpretado por Edward Norton) – vai oferecendo outra complexidade à relação de Riggan com seu Homem Pássaro ou, mesmo, com seus super poderes. A dificuldade de se desvencilhar dessa relação com seu super herói, que vai tomando conta da cena e ganhando proporções delirantes, começa a comprometer a capacidade de manejo dos diversos papéis que a vida reserva à Riggan (no palco e fora dele). Assim, Bidman nos leva à necessária reflexão sobre a importância, sobre a dor e sobre a beleza da desilusão que, segundo Maria Rita Kehl , “nos coloca diante de nossa condição: somos humanos, somos mortais, somos solitários, somos incompletos. Mas, uma vez aceitas as determinações fundamentais da condição humana, uma vez rompidos com os domínios da fantasia, se abrem para nós as possibilidades infinitas do domínio das paixões: nem a onipotência, nem a submissão, mas a conquista do território humano. O mais vasto território por onde o desejo pode se mover”. (A Psicanálise e o Domínio das Paixões In Os Sentidos da Paixão – Cia das Letras, 1986).

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