Por Ana Lucia Gondim Bastos
Um homem de corpo e alma dilacerados. Assim é o personagem de Leonardo Di Caprio em mais um premiado filme de Alejandro Iñarritu (2016). Num filme bem diferente em cenário, tempo histórico e narrativa de seu Birdman (2015), Iñarritu fala, em “O Regresso” (baseado no romance homônimo de Michael Punke), sobre como, do dilaceramento da alma, um homem pode tolerar as dores do corpo dilacerado, e resistir à morte. O cenário é do oeste americano no ano de 1822, no qual, em meio a todo tipo de adversidade natural, diversos grupos étnicos, de populações locais e de colonizadores, lutam para garantir seus espaços, inclusive comercialmente, com muita violência e nenhuma empatia. Na verdade, o filme já é um filme bem triste, a partir desse cenário que sabemos fazer parte de nossas realidades, ainda que de forma diferente, até os dias de hoje. Contudo, o roteiro tem como fio narrativo a história de Glass, um homem que acompanha um grupo de caça que comercializa peles, juntamente com um filho mestiço. A pele com cicatrizes de queimadura do rosto do filho e os flashes de memória de Glass nos contam que já trazem na bagagem uma história de perda e destruição da qual restou um com/pelo outro, numa persistência de vida e sobrevivência. Quando Glass é ferozmente atacado por um urso , sua condição física passa a ser entrave maior para que o grupo siga caminho e acaba por ser abandonado pelos companheiros. A dor, seguida pelo ódio de ter perdido o filho assassinado, faz com que a força motriz da resistência seja a da vingança. Um interessante roteiro sobre a força do psiquismo e o, muitas vezes, surpreendente, nível de tolerância do ser humano. Mas, também, sobre como o ser humano tenta se proteger ou se livrar das dores das perdas e das limitações, próprias de sua condição, infligindo, ao outro, a dor que tanto teme.
Tecendo a Trama 