39a Mostra Internacional de Cinema de São Paulo – Meu Único Amor (My Best Girl)

Por Ana Lucia Gondim Bastos

Entrar no cinema é estar disposto à testemunhar sua capacidade de nos transportar para outros tempos, para outros lugares e, com isso, para outras histórias, que não as nossas do aqui e do agora. Capacidade que tanto nos possibilita escapar da vida cotidiana, quanto ampliar os sentidos e entendimentos a ela atribuídos. Talvez, Cecília – personagem de Mia Farrow em “A Rosa Púrpura do Cairo” (Woody Allen,1985) – tenha oferecido a melhor tradução para a magia que estamos sujeitos no cinema. Quando vê, Tom Baxter (Jeff Daniels), personagem do filme, assistido inúmeras vezes, escapar da tela para declarar seu amor e preocupação por ela, Cecília também escapa da sua vida de opressão e tristeza.

A 39a Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, nos ofereceu oportunidade de uma escapada, com potencia comparável à de Cecília. Em 31 de outubro de 2015, fomos convidados a assistir, sentados no gramado do Parque do Ibirapuera, a projeção da cópia restaurada de “Meu Único Amor” (Sam Taylor, 1927), com acompanhamento musical, ao vivo, da Orquestra Sinfônica Heliópolis, sob regência do maestro David Michael Frank. O Auditório do Ibirapuera, local da projeção, tem projeto assinado por Oscar Niemeyer (1907-2012) e conta com um palco que se abre para uma plateia externa que se acomoda numa grande área verde, no meio de São Paulo. Ali, bem ao lado de uma importante avenida paulistana, sempre movimentada, nos sentamos entre árvores para assistir a uma comédia romântica lançada no mesmo ano em que Freud apresentou, no X Congresso de Psicanálise, um texto sobre o humor e sobre a importância do fio de leveza que ele pode oferecer à vida humana. Por outro lado, o cinema mudo, com poucos diálogos escritos entre as cenas, deixa ainda mais evidente a potencia da música e sua responsabilidade na tal capacidade do cinema de nos transportar para longe dali. E, assim, rimos e nos emocionamos com o casal Maggie (Mary Pickford) e Joe Grant (Charles ‘Buddy’ Rogers), no roteiro ingênuo e terno de Sam Taylor. Sentados em cangas coloridas, vestidos de forma muito descontraída e confortável, diferentemente dos personagens do filme, assistíamos, na maior parte dos casos pela primeira vez, um filme com acompanhamento de música ao vivo, o que, por sua vez, devia ser experiência bem comum a quem frequentava cinemas no fim dos anos 20. Ou seja, tudo tão diferente e tão igual! A magia do cinema, o encanto e a leveza da comédia despretensiosa, a emoção provocada pela música e a força do encontro dos instrumentos… tudo isso não muda e o nosso amor por tudo isso também não. Nessas horas, dá pra acreditar na humanidade e na sua capacidade de criação e de comprometimento com o belo. Só posso ser muito grata à organização da Mostra e esperar a próxima oportunidade!

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