Por Ana Lucia Gondim Bastos
“A pior escuridão é a dos olhos fechados”, diz o professor de história Mallory (Dominic West) para Florence Cathcart (Rebecca Hall), uma caça charlatões, já famosa por desmascarar fraudes envolvendo assuntos sobrenaturais. No suspense, “O Despertar” (Nick Murphy, 2011), Florence é uma escritora que, através da sua atuação profissional, empenha-se em se libertar dos medos que marcaram sua infância e do desconforto da possibilidade de considerar a existência de um mundo dos mortos, no qual poderia habitar o ex-noivo, morto em batalha na Primeira Guerra. Por conta do sucesso de seus livros é convidada a desvendar as condições da morte de um aluno de um internato para meninos, até então associada à presença de um fantasma que assombra o local. Inicialmente, Florence, recusa o trabalho, mas acaba convencida a pegar mais esse caso, pelo argumento de que poderia ser responsável pelo fim do medo que domina as crianças da escola. Pelo menos são essas as informações que temos até meados do filme. Todas, aos poucos, vão se confirmando, mas, também, se mostrando, cada vez mais, incompletas e superficiais, assim como as conclusões a que vai chegando a astuta investigadora.
O roteiro desse filme me fez lembrar a analogia que Freud costumava fazer entre o trabalho da psicanálise e o da arqueologia. Segundo ele, para se obter entendimentos acerca do que acontece num psiquismo, faz-se necessário alcançar suas várias camadas, através de escavações cada vez mais profundas, para que, então, seja possível reunir diversas pecinhas que, articuladas, venham a oferecer pistas de suas formações.
Numa história que se passa no ano em que Freud publica “Psicologia de Massas e análise do Eu”(1921) – obra que também traz os incômodos ecos da destruição da guerra – Somos convidados a passear por labirintos de lembranças, apagamentos e recordações disfarçadas por fantasias que encobrem vivencias de difícil digestão. Em cada camada, uma nova pecinha e um novo sentido para o que vinha sendo construído, até então. Aos poucos, um nexo maior vai se apresentando à claridade, para Florence e para todos daquela escola. Ou seja, temos em “O Despertar”, mais um filme que fala dos fantasmas que habitam a escuridão dos olhos fechados. Sempre uma reflexão interessante e oportuna.
Análise deliciosa.Para os fãs de psicanálise e filmes de mistério, parece um prato cheio. Mobilizada para ver já, rs
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Como sempre, Ana Lucia analisa tudo com tanta profundidade e detalhes, que não resta ao leitor senão ir ver o filme.
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