Por Ana Lucia Gondim Bastos
Há semanas recebo uma enxurrada de informações e opiniões sobre uma série americana, voltada para o público adolescente, que, recentemente, estreou no Brasil: 13 Reasons Why (baseada no livro de Jay Ascher, 2007). A série, original da Netflix, trata de textos confessionais, deixados em fitas gravadas, por uma adolescente que optara pelo suicídio. Em cada fita, a denúncia de uma pressão ou violência sofrida e de diversas omissões. Os colegas, para os quais foram dirigidas as fitas, vão ficando atordoados, a medida que escutam, e, cada vez mais vão se isolando, culpados ou acuados. Nenhum movimento transformador é produzido pelo impacto das palavras da menina que desistiu de viver naquele mundo, apesar de sonhar com a Universidade e com espaços da vida adulta, nos quais supunha poder vir a ser quem escolhesse ser, a partir de suas possibilidades.
No início o caráter de denúncia entusiasma, inclusive o público adulto, mas, logo nos primeiros episódios o isolamento e a culpa persecutória que recai sobre os que podem ter sido “a Reason Why”, passa só a angustiar e a oferecer a sensação de beco sem saída existencial. Talvez por isso tanta discussão acerca do que pode provocar uma série como essa: previne ou precipita desinvestimentos na vida?
Mais ou menos na mesma época, as redes sociais foram bombardeadas de informações sobre um jogo de morte: O Baleia Azul. Segundo os que tiveram contato com o jogo e seus seguidores (também público adolescente), quem entrasse não poderia sair e, após de uma série de tarefas de auto mutilação, o participante seria levado à morte. Depois de um tempo absurdada com tudo isso, me lembrei do impacto que teve, em mim, uma outra série bem atual, desta vez da TV britânica, Black Mirror (Charlie Booker). Esta última, traz episódios, independentes uns dos outros, cujo ponto de convergência é a experiência humana submetida às engenhocas tecnológicas e a ilusão de onipotência que elas nos oferecem, junto com a potencialização de um super investimento narcísico. Também, os primeiros episódios são encantadores: os roteiros, muito bem escritos, começam dando ao espectador uma intensa sensação de estranhamento e, ao final do episódio, tal sensação dá lugar a um profundo sentimento de familiaridade, que chega a ser desconcertante. Contudo, depois de alguns episódios, aquele excesso distópico, nos joga no tal beco sem saída, do/no qual ou nos conformamos ou nos desesperamos. De todo modo, seja via pânico ou via depressão, caímos em caminhos muito pouco criativos ou produtivos.
Partindo do pressuposto, que fora da morte, o beco sem saída é sempre um lugar a ser questionado, fui buscar referências no meu baú de memórias. Logo me lembrei de um filme brasileiro sobre a adolescência, seus percalços e… sua beleza! “As Melhores Coisas do Mundo” (Lais Bodansky, 2010), tem como frase final de Mano (papel de Francisco Miguez): “Não é impossível ser feliz quando a gente cresce, só é mais complicado”. Antes dessa conclusão, Mano descobre a política, o sexo, a percepção crítica das idealizações, dos preconceitos, o aspecto vulnerável e frágil dos pais, professores e do irmão mais velho, a importância de expressar sentimentos e a eles dar contorno (através das artes, por exemplo), o medo do não pertencimento e a importância de enfrenta-lo… e toda essa complicação que vem depois que a gente cresce. Mano também sofre com as pressões e omissões do/no cotidiano do ensino médio. Laís Bodansky (baseada no texto de Gilberto Dimenstein e Heloísa Pietro) também trata de temas duros como a tentativa de suicídio, o bullyng desenfreado através das redes sociais, a decepção com o mundo adulto ou o sentimento de não ser compreendido por ninguém que realmente possa ajudar. Mas, a vida adolescente se tem a morte, tem também o amor, tem poesia e prosa, tem o mote e a glosa, tem medo e rosa, como na música de Caetano Veloso. Ou seja, tem as melhores coisas do mundo para que caminhos sejam encontrados para fora de becos sem saída. Precisamos resgatar essas “Melhores Coisas do Mundo” e voltar a conversar sobre o Mano e suas buscas. E não só sobre o caminho sem volta das novas séries distópicas. Quando a esperança corre perigo, toda a humanidade corre também. Precisamos estar atentos e fortes!