Por Ana Lucia Gondim Bastos
Seguindo o pressuposto da frase, atribuída a Frederico Fellini, que diz que “toda arte é autobiográfica, a pérola é a autobiografia da ostra”, Dorota Kobiela e Hugh Welchman, em Com Amor, Van Gogh (2017), como num sonho de Kurosawa*, nos leva a passear por dentro das obras do artista, em busca do destinatário de uma última carta, em busca de amarrações para a narrativa de seus último anos, em busca do colorido das pinceladas de seus amores e desvarios, em busca de conhecer Van Gogh, depois de morto (como aconteceu com toda sua obra, reconhecida postumamente). Mais de cem artistas foram convidados a dar vida e movimento às obras de Van Gogh ( em 65.000 frames de pintura a óleo), atribuindo novos sentidos a tais obras, tão conhecidas por todos nós, dando voz a elas (e a ele), deixando-o, portanto, de alguma forma, contar sua própria história. Ainda que, ou por isso mesmo, o longa se passe um ano após a morte do artista, quando o jovem Armand Roulin, em missão proposta por seu pai, o carteiro Joseph Roulin, parte em busca de entregar a última carta escrita por Vicent ao irmão Theo.
São eles, então, que nos conduzem às paisagens pintadas por Van Gogh, às pessoas, por ele retratadas, e aos últimos momentos de vida Van Gogh, depois de deixar o hospício de Saint-Rémy e mudar-se para o vilarejo de Auvers-sur-Oise, no norte da França, para ficar mais perto do irmão Theo e do doutor Paul Gachet, até sua morte com um tiro na barriga. Talvez seja essa a forma do filme explicar a última frase proferida por Van Gogh : “A tristeza vai durar para sempre”. Tristezas que viraram pérolas. Pérolas que são, por nós, apreciadas, até hoje, com amor, Van Gogh.
*Referência à produção japonesa que apresenta uma série de curtas-metragens do diretor Akira Kurosawa (1990).