Por Ana Claudia Gondim Bastos e Ana Lucia Gondim Bastos
Quantas versões para uma mesma história, cabe num roteiro sobre a vida de um menino de oito anos? Quando o amor por uma criança, e os consequentes cuidados para com ela, viram renúncia, mentira, obstinação, insistência, resistência ou negação?
O Filho Uruguaio (Oliver Peyon, 2018), trata de tudo isso com delicadeza ímpar e sem maniqueísmos. Sylvie (Isabelle Carré) é uma mãe francesa que conta com o apoio do assistente social Mahid (Ramzy Bedia) para resgatar seu filho Felipe que há quatro anos vivia numa cidadezinha no interior do Uruguai, sem contato algum com ela. Um filme bilingue, tal como deveria ter crescido Felipe. Mas, antes que tivesse consciência para opinar sobre seu destino, teve a pátria e a família paterna como única de referência. A mãe ficou apagada de uma história que nunca desistira. É recorrente casos que alijam mães e/ou pais do convívio dos filhos, privando a criança do convívio das culturas familiares diversas, de seus pais. Isto ganha outra dimensão quando os pais são de países distintos e o filho é privado de conviver e conhecer a outra cultura, língua, costumes de sua origem. Quanto dessa história e cultura da mãe Sylvie ainda existem introjetados na vida do pequeno Felipe?
Sylvie é uma mãe com respiração ofegante de quem urge para o reencontro sonhado, o resgate de uma relação idealizada e congelada no tempo. Mahid é um assistente social que se arrisca para que justiça seja feita, mas com a delicadeza para que este encontro seja saudável. Ambos encontram o menino Felipe (Dylan Cortes) com uma infância feliz ao lado avó e a tia paterna (Virginia Mendéz e Maria Duplaa, respectivamente). Como resgatar essa relação com abismo de 4 anos? O desejo do abraço de uma intimidade esfumaçada no tempo. A dura realidade de que nada será como antes costuram a trama.
Um roteiro delicado no qual apresenta os personagens em suas idiossincrasias, muito implicados e honestamente comprometidos com suas versões e papeis na história. Personagens que são o melhor que podem ser num entrelaçado de versões que ora conflitam e ora convergem, que comportam alguns não ditos, algumas mentiras e edições da realidade, dando um tom de suspense num filme transbordante de amor. Não é só sobre justiça que se trata, é de como lidar com uma situação posta, com as impossibilidades de voltar atrás, de desfazer para refazer a história. O filme, ao fim, conta de como a empatia e o amor por uma criança, pode, sim, ter uma função facilitadora de transformação de realidades. Realidades de todos, a partir de seus encontros, pelo bem estar de um. Roteiro comovente e sensível!
